Entre ciências e etnociências

O pensamento ocidental tem estruturado muito dos seus alicerces fundamentais, a partir de dualidades mutáveis que vai refazendo e modificando. Da Filosofia Grega, nomeadamente platónica, irromperam com grande amplitude muitas destas dualidades enfatizando-se aqui a dicotomia entre epistéme e dóxa. N...

Full description

Bibliographic Details
Main Authors: Dias, A.S., Janeira, A.L.
Format: Article in Journal/Newspaper
Language:Portuguese
Published: Episteme 2005
Subjects:
Online Access:http://hdl.handle.net/10174/3118
id ftunivevora:oai:dspace.uevora.pt:10174/3118
record_format openpolar
institution Open Polar
collection Repositório Científico da Universidade de Évora
op_collection_id ftunivevora
language Portuguese
topic Ethnobotany
spellingShingle Ethnobotany
Dias, A.S.
Janeira, A.L.
Entre ciências e etnociências
topic_facet Ethnobotany
description O pensamento ocidental tem estruturado muito dos seus alicerces fundamentais, a partir de dualidades mutáveis que vai refazendo e modificando. Da Filosofia Grega, nomeadamente platónica, irromperam com grande amplitude muitas destas dualidades enfatizando-se aqui a dicotomia entre epistéme e dóxa. Na medida em que se constituem como suportes de segurança para o pensar e para o viver, pois sempre se têm desmultiplicado, quer como grelhas de orientação mental, quer como matrizes de conduta axiológica, estas polaridades têm actuado como realidades mistas, entre o que é defendido como excelência da razão e o que é usado como grelha facilitadora por hábito. Com o tempo foi-se a dualidade agudizando para transformar-se em nítida oposição ao contrapor diametral e significativamente o eco socrático (epistéme, conhecimento) à argumentação sofística (dóxa, opinião). Oposição que a literatura expandiu, em seguida, outras a tantas oposições contrapondo razão e pré-juízos ou mitos, ciência e fé ou crença, verdadeiro e falso, erudito e popular, teórico e prático, abstracto e concreto. É tendo como pano de fundo este universo de dicotomias com relevo para a oposição entre epistéme e dóxa que se podem encontrar as determinantes da denegação - oposição do senso comum por parte do conhecimento científico. Esta oposição começou a ser questionada pela Pós -Modernidade, ao contribuir para que o pensamento se vá desconstruindo e emancipando desse passado. Desta contestação sai a denúncia da ignorância, da arrogância e da inexactidão subjacentes a uma literacia científica baseada em posturas teórico-práticas que são afinal preconceituosas ao desdenhar a análise rigorosa preferindo desconhecer, subalternizar e desprezar o conhecimento e o saber fazer popular, autóctone ou indígena. Posturas teórico-práticas que entretanto começaram a abrir brechas, devido a certa adesão às Etnociências, por parte da comunidade científica. A novidade relativa das etnociências a par com a sua natureza interdisciplinar que apela em geral a uma grande variedade de áreas do saber, engendra problemáticas relacionadas com o campo legítimo de estudo. Com efeito, as etnociências vêm juntar de novo o que antes foi separado alterando o status quo. Áreas disciplinares, que foi necessário individualizar no passado confluem numa nova disciplina (o que não se faz sem convulsões), cuja diferente perspectiva obriga a toda uma recontextualização, determinando transformações de natureza, conteúdos e formas. Daqui deriva também a necessidade de ajustar metodologias e procurar novos procedimentos. Da emergência a contextos actuais colocam-se temáticas aliadas ao enquadramento científico de saberes fazeres tanto passados como actuais que têm subjacentes diferentes universos cognitivos, diferentes formas de viver e interpretar o mundo bem como longos percursos históricos por vários ambientes, várias naturezas, vários continentes. O diálogo entre as novas etnociências e as áreas disciplinares que nela confluem continuará certamente intenso, permanente e mutuamente enriquecedor até que seja (se for) cortado o cordão umbilical. Da existência de diálogo e desafio no seio destas relações complexas resulta um ambiente propício ao aparecimento de algumas novidades como seja, por exemplo, o Jardin des Premières-Nations por certo o primeiro grande Jardim Etnobotânico, tornado realidade em 2001, no seio do Jardin Botanique de Montreal, considerado o terceiro maior jardim botânico em diversidade de espécies à escala mundial.
format Article in Journal/Newspaper
author Dias, A.S.
Janeira, A.L.
author_facet Dias, A.S.
Janeira, A.L.
author_sort Dias, A.S.
title Entre ciências e etnociências
title_short Entre ciências e etnociências
title_full Entre ciências e etnociências
title_fullStr Entre ciências e etnociências
title_full_unstemmed Entre ciências e etnociências
title_sort entre ciências e etnociências
publisher Episteme
publishDate 2005
url http://hdl.handle.net/10174/3118
long_lat ENVELOPE(-62.883,-62.883,-64.517,-64.517)
ENVELOPE(35.277,35.277,63.715,63.715)
geographic Falso
Nela
geographic_facet Falso
Nela
genre Premières Nations
genre_facet Premières Nations
op_relation Dias AS e AL Janeira 2005 Entre ciências e etnociências. In A.L.Janeira (coordenadora). O mundo nas colecções dos nossos encantos. Episteme (Suplemento Especial) nº 21 jan./jun.: 107-127
1413-5736
http://hdl.handle.net/10174/3118
nd
221
op_rights openAccess
_version_ 1766174199804592128
spelling ftunivevora:oai:dspace.uevora.pt:10174/3118 2023-05-15T18:03:23+02:00 Entre ciências e etnociências Dias, A.S. Janeira, A.L. 2005 http://hdl.handle.net/10174/3118 por por Episteme Dias AS e AL Janeira 2005 Entre ciências e etnociências. In A.L.Janeira (coordenadora). O mundo nas colecções dos nossos encantos. Episteme (Suplemento Especial) nº 21 jan./jun.: 107-127 1413-5736 http://hdl.handle.net/10174/3118 nd 221 openAccess Ethnobotany article 2005 ftunivevora 2021-05-02T09:01:50Z O pensamento ocidental tem estruturado muito dos seus alicerces fundamentais, a partir de dualidades mutáveis que vai refazendo e modificando. Da Filosofia Grega, nomeadamente platónica, irromperam com grande amplitude muitas destas dualidades enfatizando-se aqui a dicotomia entre epistéme e dóxa. Na medida em que se constituem como suportes de segurança para o pensar e para o viver, pois sempre se têm desmultiplicado, quer como grelhas de orientação mental, quer como matrizes de conduta axiológica, estas polaridades têm actuado como realidades mistas, entre o que é defendido como excelência da razão e o que é usado como grelha facilitadora por hábito. Com o tempo foi-se a dualidade agudizando para transformar-se em nítida oposição ao contrapor diametral e significativamente o eco socrático (epistéme, conhecimento) à argumentação sofística (dóxa, opinião). Oposição que a literatura expandiu, em seguida, outras a tantas oposições contrapondo razão e pré-juízos ou mitos, ciência e fé ou crença, verdadeiro e falso, erudito e popular, teórico e prático, abstracto e concreto. É tendo como pano de fundo este universo de dicotomias com relevo para a oposição entre epistéme e dóxa que se podem encontrar as determinantes da denegação - oposição do senso comum por parte do conhecimento científico. Esta oposição começou a ser questionada pela Pós -Modernidade, ao contribuir para que o pensamento se vá desconstruindo e emancipando desse passado. Desta contestação sai a denúncia da ignorância, da arrogância e da inexactidão subjacentes a uma literacia científica baseada em posturas teórico-práticas que são afinal preconceituosas ao desdenhar a análise rigorosa preferindo desconhecer, subalternizar e desprezar o conhecimento e o saber fazer popular, autóctone ou indígena. Posturas teórico-práticas que entretanto começaram a abrir brechas, devido a certa adesão às Etnociências, por parte da comunidade científica. A novidade relativa das etnociências a par com a sua natureza interdisciplinar que apela em geral a uma grande variedade de áreas do saber, engendra problemáticas relacionadas com o campo legítimo de estudo. Com efeito, as etnociências vêm juntar de novo o que antes foi separado alterando o status quo. Áreas disciplinares, que foi necessário individualizar no passado confluem numa nova disciplina (o que não se faz sem convulsões), cuja diferente perspectiva obriga a toda uma recontextualização, determinando transformações de natureza, conteúdos e formas. Daqui deriva também a necessidade de ajustar metodologias e procurar novos procedimentos. Da emergência a contextos actuais colocam-se temáticas aliadas ao enquadramento científico de saberes fazeres tanto passados como actuais que têm subjacentes diferentes universos cognitivos, diferentes formas de viver e interpretar o mundo bem como longos percursos históricos por vários ambientes, várias naturezas, vários continentes. O diálogo entre as novas etnociências e as áreas disciplinares que nela confluem continuará certamente intenso, permanente e mutuamente enriquecedor até que seja (se for) cortado o cordão umbilical. Da existência de diálogo e desafio no seio destas relações complexas resulta um ambiente propício ao aparecimento de algumas novidades como seja, por exemplo, o Jardin des Premières-Nations por certo o primeiro grande Jardim Etnobotânico, tornado realidade em 2001, no seio do Jardin Botanique de Montreal, considerado o terceiro maior jardim botânico em diversidade de espécies à escala mundial. Article in Journal/Newspaper Premières Nations Repositório Científico da Universidade de Évora Falso ENVELOPE(-62.883,-62.883,-64.517,-64.517) Nela ENVELOPE(35.277,35.277,63.715,63.715)